Divina de fátima dos Santos

Doutora em Psicologia Clínica

Aproximando gerações pela escrita

A experiência aqui descrita ocorreu como parte de um processo pedagógico realizado por meio de troca de cartas entre alunos de uma instituição de ensino localizada na periferia da cidade de São Paulo, mais especificamente, entre crianças do ensino fundamental e alunos da EJA (Educação de Jovens e Adultos) em processo de alfabetização.

Embora o uso de cartas no meio educacional não seja novidade, o foco desta vivência se direcionou não apenas para os ganhos pedagógicos, mas, principalmente, para a perspectiva intergeracional, visando aproximar estudantes de diferentes idades, períodos escolares e níveis socioeconômicos. Nossa proposta foi de favorecer e estimular a construção de uma convivência respeitosa, pautada em valores éticos e morais entre cidadãos independentes da idade, gênero e classe social. Seguimos também o pensamento de Paulo Freire (1983, p.27-8) segundo o qual “a educação tem caráter permanente. Não há seres educados e não educados. Estamos todos nos educando”.

Para Goldfarb e Lopes (2006), a aproximação de diferentes gerações, sobretudo entre jovens e idosos, pode promover e facilitar o crescimento emocional de ambos, enfraquecendo os preconceitos e estimulando o desejo de viver plenamente a vida cultural e social. A relevância desta aproximação entre gerações tem implicações sociais associadas a o sofrimento emocional e ao decorrente custo econômico provocado por um indivíduo com baixa autoestima.

Por inúmeras razões, os alunos da EJA, sobretudo os mais idosos e em fase de letramento, não tiveram oportunidade de aprender a ler e a escrever quando eram crianças e, de certa forma, sentem-se inferiorizados, com baixa autoestima e excluídos da sociedade. Esse sentimento de inferioridade provoca um retraimento que ocasiona um medo de escrever, de se colocar e de expressar o que se pensa em palavras postas no papel, pois imaginam que ninguém se interessará por suas produções.

Ao utilizar cartas como material de apoio pedagógico, muitas barreiras podem ser quebradas, pois o adulto, ao ver que uma criança escreveu a ele, sente-se na mesma “obrigação” no sentido de não decepcionar aquele pequeno ser que ainda em formação espera por sua resposta e “necessita” ser estimulado na escola, para levar os estudos a sério e para não passar pelos mesmos sofrimentos aos quais os adultos interlocutores foram submetidos ao longo de suas vidas.

Por outro lado, hoje, a comunicação das crianças, seja na internet, seja por meio de torpedos em celulares, é fragmentada e composta por inúmeros códigos eletrônicos e informais, visto que elas crescem em um mundo cercado por outras formas de comunicação igualmente válidas (CUNHA, 2002).

Ao escrever uma carta, é possível produzir um maior contato com a própria história e com a história do outro; isto possibilita a troca de informação e aproxima as pessoas no ato de compartilhar suas experiências, abrindo espaço para a imaginação e para a criatividade, bem como para a cumplicidade, além de banir o sentimento de solidão (BOLLÉME, 1988).

Um dos problemas enfrentados no mundo contemporâneo e mais precisamente nas grandes cidades é a dificuldade de convívio entre as diferentes gerações em função das inúmeras responsabilidades às quais a s pessoas estão sujeitas. Desde muito cedo, crianças cada vez menores vão à escola, e passam a conviver apenas com outras crianças de sua faixa etária e alguns poucos educadores e cuidadores adultos. Também os adolescentes ficam a maior parte do tempo nas escolas e convivem com outros jovens muitas vezes unidos pelos mesmos comportamentos, ideias e valores.

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Psicóloga Divina

Doutora em Psicologia Clínica

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